Percalços e obstáculos de um lindo desafio: falar sobre a Amazônia urbana
Uma missão: falar das cidades, das realidades e ideias urbanas da Amazônia. Lindo desafio. E que encrenca! Descrever um panorama tão vasto, no tempo medido em minutos da TV.Melhor ter ao lado alguém de absoluta confiança, como o repórter cinematográfico Laércio Domingues, que eu conheci logo ao ingressar na TV, em 1982. Já era craque. Se for contar tudo que ele já me ensinou, o relato da nossa saga amazônica encalha.
Completando a equipe, a produtora Barbara Bom Angelo. Sangue jovem e empolgado, para prover o prevísivel e o imponderável. Paulistana que amou a Amazônia à primeira vista. Operador de áudio, colete de campanha sempre abarrotado de pesos ultranecessários (baterias, lâmpadas, fitas adesivas, atenuadores de ruído, rebatedores de luz, etc, etc…) o trator Marcelo Didino. Substituído a altura, em boa parte pelo “Toyota”. Aliás, Rubens Camargo. Por motivos que conduzem a nossa primeira história de bastidor.
Boca do Acre, Amazonas. Começo da segunda semana de viagem. A câmera moderníssima, eletrônica e digitalmente espetacular, morre e apaga nossa programação de gravações. Sabe aquele irritante e intransponível aviso de “Error”? Excesso de sol amazônico? Condensação de vapores equatoriais? Nada dá jeito. Melhor solução: substituição. Lá se foi Didino de volta pra São Paulo, com ela, no primeiro voo possível.
Lá veio o Rubinho, com a nova, em sentido contrário. Claro que a câmera, depois de nos matar de raiva, durante quase dois dias, voltou à vida, inexplicavelmente, logo depois de voltar a São Paulo. A um simples apertar do botão “ON”. Vai entender. Teria sido saudade de casa? Foi o único episodio desse tipo, em seis semanas.
Já dificuldades logísticas, como alugar um carro numa cidade como Santa Rosa do Purus, no Acre, bem na fronteira com o Peru… Ali só existem menos de duas dezenas deles, quase todos de órgãos públicos. Também, sem estrada pra lugar nenhum. A cidade é pequena, mas tem ladeiras, e com aquele monte de equipamentos…
E a pista de pouco lá longe. Muito obrigado à Prefeitura, à Polícia Federal. Vivíamos de olho na movimentação deles, pra descolar carona na parte de trás das caminhonetes. Sempre com um monte de indiozinhos. Os índios são dois terços da população local.
Vivemos uma situação quase surrealista. Fomos dar uma olhada num vilarejo peruano, do outro lado do Rio Purus. O lugar se chama Palestina. Tem algumas dezenas de casas. População com aparência indígena, que depende, muito, da “metrópole” Santa Rosa, com seus cinco mil habitantes pra comprar víveres, pra quase tudo. A cidade peruana mais próxima, Puerto Esperanza, está longe demais. Aí, topamos com um… americano de bermuda, todo comido de mosquitos!
Trabalhava para uma ONG que tinha distribuído pequenos laptops para as crianças locais. Algumas delas, com arco-e-flecha nas mãos. Esta história nunca foi ao ar, por absoluta falta de tempo, no exercício doloroso de ter que escolher, no meio de um material tão rico. Lugar surpreendente, mesmo, a Amazônia. Que, na verdade, são muitas Amazônias com problemas comuns e específicos, desafios enormes e eu nem estou falando dos mosquitos. Mas essa e outras dificuldades, nossa equipe enfrentou com prazer pela importância da região pra o Brasil e para o mundo, pelo significado jornalístico, claro, mas sobretudo pelos amazônidas. Pela hospitalidade, pelo prazer demonstrado com a nossa presença, pelo tanto que eles nos fizeram sorrir e pensar no passado, no presente e no futuro deles. A gente só espera ter correspondido. E eles podem estar certos: este e o tipo de viagem que não se encerra com fim da nossa série no ar. Voltamos para São Paulo cheios de novas ideias. Até a próxima!
Alberto Gaspar
Repórter